quinta-feira, 7 de julho de 2011

Meu novo inimigo

1 – Eu imaginava que, conforme a idade vai avançando, a possibilidade de ‘conquistar’ novos inimigos vai se reduzindo. Pelo mesmo fator da longevidade, os potenciais desafetos se tornam mais compreensivos, tolerantes ou passam a nos ignorar mesmo, crentes de que não vale a pena gastar vela boa com defunto ruim. Às vezes também penso isso. Mas, o fato é que, alguns meses após os 64, me pego surpreendido por atrair um novo inimigo. E, pelo jeitão, para sempre. Não sei qual será sua influência no meu humor, mas temo que me torne um pouco mais azedo do que o habitual. Mas, é o seguinte: estamos definitivamente rompidos eu e o açúcar. Divórcio com papel assinado em cartório. Não tem volta.

2 – Mas, por que tenho eu que dividir esse assunto tão pessoal com os leitores, que pagam para ler coisas úteis e não frivolidades? Porque o açúcar está presente em praticamente tudo. Inclusive nas pessoas. E é quando se concentra em excesso que se torna proibitivo, perigosíssimo, inimigo fatal. E o curioso é que humanos com excesso de açúcar não necessariamente se tornam mais dóceis, nem mais doces. Conheço vários exemplares. Eu mesmo – pois não? Mas, conheço muitos, mas põe muitos nisso, que com glicemia nos trinques, absolutamente nos padrões recomendados pelos médicos, são incontrolavelmente insuportáveis. Azedíssimos. Em geral, são os que fazem inimigos com maior facilidade, embora seja verdadeiro que, do lado reverso, desfrutam de amigos caninamente fieis, alguns afeitos ao estranho prazer de lamber-lhes as botas.

3 – O problema, portanto, não está no excesso ou na ausência de açúcar. Está na forma de conviver com aqueles que não nos são simpáticos, não nos aplaudem, não são solidários com nossas ideias e não aprovam a forma como penteamos o cabelo – no meu caso, lenta e gradualmente rareando. Não é fácil mesmo. Sobretudo quando a cabeça se deixa coroar pelo convencimento de que o portador não erra, tem todas as respostas, todas as soluções e ninguém deve ousar ou atrever-se a atravessar-lhe as convicções. Sobra gente assim, com concentração em grande proporção em certo endereço do centro da cidade que – quero crer – é desnecessário nomeá-lo.

4 – Em geral, é dessas relações que nasce a errada conceituação do que é inimigo, quando na verdade ele apenas é oponente em ideias, em princípios e em concepções. Na minha relação com o açúcar é um pouco diferente, tendo em vista que ele é letal organicamente. Nas outras, deixei de eleger inimigos há bom tempo. Até ao contrário, faço certo esforço em recuperar desafetos eventuais por acreditar que, deste plano para outro – embora os ‘sábios’ pensem o contrário – ninguém irá como vencido ou vencedor. Mas, esta é uma bobagem a que não faltam personagens a se dedicar, apontando o polegar em acusação sempre que contrariados mesmo que em apenas uma vírgula. Inimigos? Quando inevitáveis, têm que ser para sempre. Como o açúcar, ao qual não darei as costas mais por um segundo até o fim dos tempos. Dos meus tempos, naturalmente.

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