sábado, 20 de novembro de 2010

Vazando pelo ralo

1 – A fidelidade política é aspecto comum à convivência de lideranças e liderados. É natural, portanto. Todavia, sempre cabe certo comedimento para que esse tipo de manifestação não ultrapasse certos limites, evitando ingressar no terreno da subserviência. Aí já é se transformar em vassalo. Pois é o que tenho percebido em certas manifestações, neste pós-eleições em que alguns quedaram derrotados e outros celebram efusivos. Algumas manifestações sinceramente me causam pena, por verificar até onde se desse para – rigorosamente – puxar o saco de figuras em evidência. Ora, uma das riquezas que o ser humano tem o dever de preservar é a personalidade própria, a altivez e a independência. Até mesmo porque, sobre a face desse nosso planeta, nada é definitivo e imutável. A vida dá voltas e, quando isso acontece, impõe certas cobranças difíceis de serem digeridas.

2 – Eu não me esqueço de trombadas monumentais entre figuras que hoje se beijam de língua, no que me parece ser uma relação falsa e cínica, pautada pela conveniência. Pode ser que a conveniência tenha pautado as duas situações. Não sei como reagiriam hoje, se fosse passado o filminho dos episódios que, ao menos de ouvido, testemunhei. Que os caminhos convergiram é evidente. Diz certa sabedoria que, quando não se consegue vencer o inimigo, o melhor a fazer é aliar-se a ele. Vejo bastante gente, e gente da grossa, como diria um especial amigo quando quer se referir a personalidades do andar de cima, praticando esse esporte.

3 – Objetivamente, a questão é a seguinte: instalou-se um deprimente endeusamento, despudorado, indigente, miserável. Não é por sinceridade, como é óbvio. É por cruzamento de interesses. Além do mais, quem anda puxando o saco de maneira tão desmesurada sabe o que está fazendo. E com quem está fazendo. Vai no cerne. Ataca no ponto. A vida me ensinou – muito embora eu tenha aprendido tão pouco na vida – que certas personalidades nasceram para o endeusamento, sobrevivem do orgulho, cultivam a soberba. É um direito, reconheço. E para estes não faltam os acólitos, aquele pessoal da fila do gargarejo, que baba ante o rei.

4 – Por natureza, costumo ser esperançoso. Acredito na ‘renovação da espécie’ política, sobretudo quando um ou outro exemplar põe a cabeça fora d’água, parecendo querer emergir para um porvir. De velho – digo eu mesmo – já me basto eu mesmo (nem sei se esta construção está muito certa, mas que vá). Penso que, quando faltam horizontes, esperanças, pouco se terá a fazer em cima desta bola. Mas, como se diz que as decepções costumam ser inversamente proporcionais, em sua dimensão, às satisfações, estou começando a achar que estou perdendo tempo.

5 – Por experiência própria, sei que o sistema é cruel e que as vaidades humanas são terríveis sob o ponto de vista destrutivo. Aqueles quinze segundos de glória nem sempre são administrados com sabedoria. De todo modo, tendo manter o otimismo até o extremo dos extremos. Mas, quando aquela mosca azul inocula a maldita seiva, não há remédio que consiga curar. Pois assim estou vendo o que supunha merecer a minha fé, escoar pelo ralo.

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