sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Autofagia política

1 - Eu me recordo de ter escrito, no pós-eleição de 2008, que a maioria conquistada pelo prefeito Carlos Nelson na Câmara seria algo difícil de controlar e de manter. A Câmara havia sofrido ampliação em suas cadeiras, subindo de 10 para 17 e, nesse conjunto, 14 chegaram ao andar de cima do Paço montados na garupa do governismo. Em princípio, Márcia Róttoli, Orivaldo Magalhães e Benedito do Couto seriam vozes isoladas, considerando a dimensão da bancada situacionista. Dizia eu então que o difícil era saber quanto isso duraria. Que não duraria eternamente apostei desde o começo, me lembro que mencionando, entre as razões para o esgarçamento, a disputa de poder e de interesses.

2 – Hoje, para confessar, acho que o monolitismo foi longe demais. Foi à Câmara, afinal, não um grupo afinado partidária, programática e ideologicamente, mas o resultado de uma salada de frutas, ou numa outra visão, de uma grande feijoada, com ingredientes dos mais diferentes sabores. O governismo, em resumo, não foi construído sobre ideias e propostas. Erigiu-se sobre interesses. Suspeito haver, entre os eleitos, vereador que foi conhecer na campanha. Teria sido em cima do caminhão se comícios tivessem havido. Ora, essas construções não costumam mesmo resistir todo tempo, ainda que possam resistir até por anos. Pois resistiu por menos de dois. Constata-se o miserável grau de unicidade quando se verifica que, sequer dentro do próprio partido a que se encontra filiado o prefeito, há afinamento de posições. As contas do prefeito, relativas a 2007, foram ao ralo com votos tucanos. E não é de se estranhar, porque, no rigor das coisas, Carlos Nelson é mesmo um estranho no ninho.

3 – Restam a Carlos Nelson dois anos de mandato. De governo, um e um tantinho mais, porque quando o calendário virar de dezembro de 2101 para janeiro de 2012, estará aberta a temporada eleitoral e, a partir daí, salve-se quem puder. Não vejo como, exceto se na mais doce pressão, o prefeito vai conseguir reagrupar de novo as ovelhas desgarradas. A política costuma ser um Atlântico de enganos, mas certas posições estão me parecendo por demais consolidadas para que possam ser revertidas. Em alguns casos, a indisposição alcança o terreno pessoal. São fundas as queixas e muitas delas de ordem individual. Aí fica mesmo difícil.

4 – Para arrematar, não é a Carlos Nelson que deve caber necessariamente a tarefa de recuperar os infiéis. Ele, afinal, não estará na rinha. E a quem caberá tal encargo? Eis uma enorme interrogação sem resposta. O governo não projetou – ao menos até aqui – alguém com luz tão intensamente suficiente para contornar as diferenças e erguer-se com algum cacife para ser aquilo que se costuma chamar de ‘nome natural’. O governo não partilha virtudes. É exercido unipessoalmente, opera impositivamente. O que é, aliás, uma das causas das reações agora mais agudas e explícitas. O cenário, em resumo, não sugere a hipótese do refluxo. Ao contrário, sinaliza para crescente radicalização. E, por fim, sinaliza lá adiante com a perspectiva de uma eleição renhida, não improvavelmente num quadro de autofagia política.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

A volta do prazer

1 – Que bom! Rivaldo vai defender o Mogi Mirim no próximo Campeonato Paulista. Todos nós o conhecemos, desde que foi revelado para o mundo vestindo a camisa vermelhinha. Aqui chegou desconhecido, mirrado. Foi uma aposta de Wilson Barros, que o descobriu como craque em apenas um olhar. Juntamente com ele, aqui aportaram os não menos desconhecidos Leto e Válber. Não sou capaz de dizer se Rivaldo é melhor que os dois ou o contrário. Mas, o fato é que acabou se transformando na pérola do Carrossel Caipira, alvo de cobiça e, por fim, senhor do mundo.

2 – Sob o ponto de vista de reputação e consagração, este Rivaldo de agora é outro. Não é mais a aposta, mas um campeão do mundo consagrado e festejado por vários continentes. Rico também – o que lhe é de direito. Este é o craque que estará deslizando pelos gramados paulistas, a partir de janeiro, envaidecendo e orgulhando os mogimirianos. E craque sempre é agradável de ver, mesmo que seja pagando um pouco mais caro. O melhor custa mesmo mais caro. Além disso, Rivaldo vai erguer o Mogi Mirim Esporte Clube a um outro patamar. As lentes das tevês com certeza estarão atentas a ele, torcedores não faltarão a lhe pedir autógrafos, uma camisa, o calção ou que seja a caneleira.

3 – Em resumo, pressinto que o craque-dirigente porá o Sapão da Mogiana, como gostosamente se referia ao time a inesquecível Zezé Brandão, em outra órbita. Atrevo-me a dizer que, com Rivaldo, o Mogi será o grande entre os pequenos. Excluídos Corinthians, Palmeiras, São Paulo e Santos, não haverá entre os demais alguém com luz e ressonância semelhante. Quando o time jogar contra o Linense, por exemplo, não será um duelo de pequenos. Ao menos um grande estará em campo, ainda mais se Denílson e Paulo Isidoro forem capazes de jogar bola compatível com a do presidente. Pressinto mais: que teremos espetáculos de nível, agradáveis de serem vistos, compensadores de todos os sacrifícios. Por consequência, aposto em que, após anos de secura e estádio vazio, o torcedor voltará às arquibancadas. Creio que teremos os ingredientes para resgatar o gosto de ‘ir ao campo’, como é habitual dizer, ao contrário de ficar em casa diante da tela fria e impessoal da televisão.

4 – Para ser sincero, Rivaldo está me fazendo recuperar o entusiasmo pelo futebol – aquele futebol logo ali, pertinho, quase vizinho, que para assistir não é preciso viajar quilômetros e pagar pedágio. É só subir a Monsenhor Nora, um pulinho. Estou me convencendo de que, finalmente, a estiagem vai ter fim. Vamos ver toque refinado, o balão correndo bem rente à relva, como diziam nossos antigos locutores, a jogada feita com arte, inteligência, sutileza, malícia – com tudo que é próprio do futebol brasileiro. Quem garante? Ora, esse pernambucano esguio, algo tímido, por quem passei, há anos, dentro de um ônibus circular que seguia em direção ao Jardim Maria Beatriz, cuja personalidade parece não ser tido minimamente abalada pela glória e pela fama. Boa bola, Rivaldo.

sábado, 20 de novembro de 2010

Vazando pelo ralo

1 – A fidelidade política é aspecto comum à convivência de lideranças e liderados. É natural, portanto. Todavia, sempre cabe certo comedimento para que esse tipo de manifestação não ultrapasse certos limites, evitando ingressar no terreno da subserviência. Aí já é se transformar em vassalo. Pois é o que tenho percebido em certas manifestações, neste pós-eleições em que alguns quedaram derrotados e outros celebram efusivos. Algumas manifestações sinceramente me causam pena, por verificar até onde se desse para – rigorosamente – puxar o saco de figuras em evidência. Ora, uma das riquezas que o ser humano tem o dever de preservar é a personalidade própria, a altivez e a independência. Até mesmo porque, sobre a face desse nosso planeta, nada é definitivo e imutável. A vida dá voltas e, quando isso acontece, impõe certas cobranças difíceis de serem digeridas.

2 – Eu não me esqueço de trombadas monumentais entre figuras que hoje se beijam de língua, no que me parece ser uma relação falsa e cínica, pautada pela conveniência. Pode ser que a conveniência tenha pautado as duas situações. Não sei como reagiriam hoje, se fosse passado o filminho dos episódios que, ao menos de ouvido, testemunhei. Que os caminhos convergiram é evidente. Diz certa sabedoria que, quando não se consegue vencer o inimigo, o melhor a fazer é aliar-se a ele. Vejo bastante gente, e gente da grossa, como diria um especial amigo quando quer se referir a personalidades do andar de cima, praticando esse esporte.

3 – Objetivamente, a questão é a seguinte: instalou-se um deprimente endeusamento, despudorado, indigente, miserável. Não é por sinceridade, como é óbvio. É por cruzamento de interesses. Além do mais, quem anda puxando o saco de maneira tão desmesurada sabe o que está fazendo. E com quem está fazendo. Vai no cerne. Ataca no ponto. A vida me ensinou – muito embora eu tenha aprendido tão pouco na vida – que certas personalidades nasceram para o endeusamento, sobrevivem do orgulho, cultivam a soberba. É um direito, reconheço. E para estes não faltam os acólitos, aquele pessoal da fila do gargarejo, que baba ante o rei.

4 – Por natureza, costumo ser esperançoso. Acredito na ‘renovação da espécie’ política, sobretudo quando um ou outro exemplar põe a cabeça fora d’água, parecendo querer emergir para um porvir. De velho – digo eu mesmo – já me basto eu mesmo (nem sei se esta construção está muito certa, mas que vá). Penso que, quando faltam horizontes, esperanças, pouco se terá a fazer em cima desta bola. Mas, como se diz que as decepções costumam ser inversamente proporcionais, em sua dimensão, às satisfações, estou começando a achar que estou perdendo tempo.

5 – Por experiência própria, sei que o sistema é cruel e que as vaidades humanas são terríveis sob o ponto de vista destrutivo. Aqueles quinze segundos de glória nem sempre são administrados com sabedoria. De todo modo, tendo manter o otimismo até o extremo dos extremos. Mas, quando aquela mosca azul inocula a maldita seiva, não há remédio que consiga curar. Pois assim estou vendo o que supunha merecer a minha fé, escoar pelo ralo.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Cada um dá o que tem

1 – Por hábito e por necessidade de ofício, utilizo permanentemente os serviços oferecidos através da Internet. Minha matéria prima, como de todo jornalista, é a notícia. No curso da recente campanha eleitoral, cometi alguns escritos e li muito. Mas, muito mesmo. E de tudo isso, uma enorme parte, senão a predominante, com fortes ingredientes de intolerância e de ódio. Vi gente de qualidade pondo à luz pobrezas escondidas. Nesse mesmo período, recebi mensagens indesejadas, seja porque não as pedi, seja porque de conteúdo rançoso e raivoso. Tudo isso foi me causando a sensação de que, um dos mais importantes instrumentos postos à disposição do cidadão, foi pessimamente utilizado, em muitas das vezes para externar frustrações e indigência mental.

2 – Agora, leio que a organização Safernet, que abriga denúncias de violações contra os direitos humanos, apresentou denúncia ao Ministério Público Federal acerca da prática de racismo e de apologia a crimes contra a vida. Por maior que venha a ser punição, se isso de fato ocorrer, será infinitamente desproporcional ao mal causado. No duplo sentido: da agressão a valores e da banalização de ferramenta tão útil como a rede mundial de computadores. Desde logo digo que as manifestações permitiram constatar a existência de demônios de todos os lados. Não houve só os bonzinhos de uma banda e os malvados de outra.

3 – Caramba, a liberdade de manifestação de idéias é uma bem de valor incalculável. E o é porque esse é um direito que não poderia ser sonegado a ser humano algum em qualquer parte que seja do planeta. Se você não pode se exprimir, para aplaudir ou para criticar, para expor o que pensa, para tentar influenciar como lhe cabe como cidadão, de que servirá o resto? O que me pareceu ficar patente é que boa parte dos seres humanos não sabe conviver com tais valores, supondo que eles sejam ilimitados no sentido de que, ao invés de opinar e exprimir conceitos, dão liberdade à exploração do terreno da ofensa, da agressão, do ataque vil e de outras condutas em total desacordo com os padrões de convivência humana.

4 – Sabe-se que os bens que a sociedade cria para si mesma nunca estão livres dos preços e dos efeitos nocivos que podem dar causa, dependendo do modo com que sejam utilizados. E a internet, desgraçadamente, oferece um vasto território para ocultar a face, para dar o tapa e esconder a mão, para assacar calúnias e não ser alcançado pelos braços da lei. Na campanha eleitoral da qual acabamos de sair, verificou-se uma demoníaca exacerbação dessas condutas, quando respeito pelo outro foi atirado à podridão dos lamaçais. A velha sabedoria diz que “cada um dá o que tem”. É uma triste e desgraçada realidade. Acho que ao tropeçar em uma pedra, até os padres soltam um palavrão. É a reação da hora. Não é aquilo que está por dentro dele. Já os que se esconderam atrás dos teclados dos computadores para expressar seus maus instintos nada mais fizeram do que dar o que tinham.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Projetando para 2012

1 – Há alguma relação a fazer entre o resultado do segundo turno da eleição presidencial e o futuro político mais imediato da cidade, considerando o desempenho alcançado pelo candidato José Serra, que bateu em 72% da preferência dos mogimirianos contra apenas 28% de Dilma Rousseff? Uma coisa pode ser projeção para outra? Em linguagem mais direta: 2010 pode ser um sinal para 2012? Responder assim num bate-pronto de sim ou não é uma imprudência. Talvez até mesmo tolice ou, quem sabe, uma irresponsabilidade.

2 – Aos resultados eleitorais nem sempre se reproduzem nas diferentes hierarquias, do federal ao municipal. O pleito local tem nuances muito próprias, além do natural aquecimento das disputas que ganham contorno, muitas vezes, até pessoais. Só isso já é o bastante para não estabelecer, de imediato, paralelo entre uma coisa e outra. Todavia, há casos e casos. Tomo Campinas: elege em repetição um aliado de Lula, Hélio de Oliveira Santos, para a Prefeitura, e prefere o tucano José Serra na disputa presidencial. Tomo Mogi-Mirim: habitualmente vem elegendo nomes contrários aos da corrente lulista. Desta vez, por exemplo, foi o que se chama de resultado acachapante. Ou goleada, no jargão futebolístico.

3 – Explicações, sim, haverá para o fenômeno. Além do que pode ser a preferência natural do eleitor mogimiriano, sem influência alguma de lideranças ou conselheiros, é claramente presente a desigual relação de forças políticas no ambiente do município. Relação de forças que, além de ser partidária, é grupal. O governismo de hoje na cidade, por exemplo, não expressa uma majoritariedade partidária, mas de grupo. Em torno da administração estão reunidas correntes de muita, pouca ou nenhuma afinidade. E isso pesa. A oposição, ao contrário disso, é absolutamente fragmentada em legendas. Portanto, não orgânica enquanto conjunto e desorganizada enquanto individualmente.

4 – Dito isso, penso que se os comportamentos de 2010 se reproduzirem em 2012, o que me parece difícil, a tendência será de que os resultados também se reproduzam. Com alguma escala de diferença, mas com grande probabilidade de não serem diferentes no sentido de vencedores e perdedores. Aliás, entre outras razões, já foi por isso que, há dois anos, os oposicionistas só conseguiram enxergar o vencedor pelo binóculo, tal a distância entre eles e este.

5 – Ora, o que aconteceu este ano pode tender a se repetir na disputa local, em outubro de 2012, se dois fatores não estivessem em mira. Um deles é a previsível fragmentação, agora, do grupo governista, tantas são as ambições, no seu próprio seio, para a sucessão de Carlos Nelson. Com certeza o prefeito vai segurar alguns, mas improvavelmente não será capaz de amansar todos. O outro fator é a perspectiva de que os contrários à atual gestão, depois do que aconteceu em 2008, tenham aprendido a lição. Não é possível, afinal, que não conheçam a velha sabedoria de que errar é humano, persistir no erro...