sábado, 23 de outubro de 2010

Quase um pigmeu

1 – Não são todos os políticos que se esforçam por zelar por sua biografia. Ora exacerbam na sua dimensão e se erigem nos senhores de todas as coisas, todas as vontades, todos os saberes. Ora dão um belíssimo pontapé em sua história, no desespero por uma conquista, um mandato, um degrau a mais de poder. As eleições deste ano estão deixando para a posteridade uma exemplar demonstração do quanto a visão embaça quando a iminência do fracasso parece um oceano roçando os lábios, pronto a levar a vítima à morte por afogamento.

2 – Precisamente, refiro-me ao ex-governador José Serra, a estas alturas com tantas probabilidades de vencer a eleição quantos são as de quem aposta na Mega Sena. Os números teimam em não lhe favorecer. Ou, melhor dizendo, a maioria dos eleitores insiste em negar-lhe adesão. Mantenho certas cautelas, porque pesquisas, afinal, são pesquisas. Mas, não me parece crível que em uma semana dê a volta na opositora. Voltando às ideias, Serra vai sair da disputa com estatura inferior, mas muito inferior em relação àquela com a qual entrou. Por que?

3 – De uma figura com presença histórica reconhecida até pelos contrários, portador de uma biografia respeitável pelas funções ocupadas em décadas de presença na vida política, não se poderia esperar que resvalasse para varejo tão mesquinho, descendo às profundezas dos apelos eleitoreiros nitidamente de ocasião. Para traçar um paralelo, não me surpreenderia com promessa de Maluf de elevar o salário mínimo a cinco mil dólares. De Maluf se pode esperar tudo e um pouco mais. Mas, foi espantoso ver um ex-governador conhecido por seu rigor com os números acenar com mínimo de 600 reais, 10% de aumento para aposentados, pagamento de um bolsa-família extra, semelhante a um 13º salário, e coisas do gênero. A seus adeptos convictos e sinceros, Serra deve ter causado arrepio dos pelos e dos cabelos. Com perdão da ofensa, mas esteve próximo de igualar-se aos Levy Fidelix da vida, que nos aborrecem teimosamente em todas as campanhas para governador e presidente, com suas excentricidades e seus absurdos.

4 – É verdade que Dilma Rousseff, até ontem (me acautelo porque a campanha ainda não acabou), foi incapaz de fazer verter uma única ideia em que pudesse estar presente seu DNA. Repetiu o que lhe mandaram dizer e surfou comodamente a onda de Lula. Por isso mesmo, Dilma nem precisa mesmo trazer à luz grandes ideias. Ao contrário de Serra, por duas razões. Primeiro, porque teria que contrapor soluções convincentes às praticadas pelo atual governo para poder inverter o girar da roda. Em segundo lugar, pela reputação de que desfruta, de agente competente, com longa experiência política e administrativa acumulada ao correr de anos, desde que tenro jovem presidiu a UNE.

5 – Serra preferiu a contramão da direção que teria por obrigação seguir. Cedeu aos apelos politiqueiros. Subordinou-se às regras das quais lançam mão os habituais promessões – no que, aliás, se transformou. Pena. Que me perdoem seus admiradores, mas se essa campanha foi uma porcaria, o foi por substancial contribuição de Serra. Que, por isso mesmo, sai dela menor, mas muito menor do que entrou. Quase um pigmeu.

sábado, 16 de outubro de 2010

Até quando, Lula?

Caramba. O governo vai terminar e Lula continua insistindo na tese divisionista entre ricos e pobres. Em Minas, disse que as elites ainda não o absoveram enquanto metalúrgico na presidência da República.

“Agora é preconceito e medo de uma mulher ganhar as eleições”, afirmou. Que coisa mais atrasada, inteiramente fora de contexto histórico.

Lula foi eleito duas vezes. E em situação a não deixar qualquer dúvida quanto à preferência dos brasileiros. Será que é capaz de identificar os eleitores que o escolheram, de modo a supor que, fora da categoria dos pobres, os outros todos foram contrários?

Fosse assim e não se elegeria uma única vez. O argumento é usado como se, agora, houvesse uma conspiração das tais elites contra a candidatura de Dilma Rousseff.

Quanto bobagem. São Paulo já teve duas prefeitas. Aliás, ambas do PT. Fortaleza também. Santos também. O Rio Grande do Sul tem uma governadora e o Rio Grande do Norte também já foi conduzido por uma mulher.

Preconceito? Isso é tese com validade vencida. Se Dilma ganhar, como parece mais provável, será por uma série de atributos em que, penso, pouco pesará o fato de ser mulher. Mas, se perder, com certeza não será pelo fato de ser mulher.

Lula está na história do Brasil por múltiplos fatores, inclusive o de ter sido o primeiro operário a ter galgado a presidência do país. Não será, todavia, por esse discurso que, ao contrário do que diz Dilma, nada tem do espírito tolerante do brasileiro.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Arremesso de lama

1 – Quando foi diferente? Desgraçadamente, as eleições não conseguem se livrar do componente denunciatório. Porque eleição é cercada de elementos cruéis. Para vencer, vale tudo, até difamar a mãe do adversário, que na campanha é transformado no pior dos inimigos. Compreendam bem: não estou aplaudindo, mas apenas fazendo um resgate do que os anos me mostraram. Esse esporte de arremesso de lama no concorrente é praticado em todas as esferas. De cima em baixo, de cabo a rabo. Já aconteceu muito por aqui. Às vezes, funciona, produz efeito. Em outras, a superior vontade dos cidadãos ignora essas condutas.

2 – Trato do tema pelo quanto ele foi recorrente no debate entre Dilma Rousseff e José Serra, domingo à noite, na TV Bandeirantes. Dilma se antecipou no tratamento do assunto, sobre o qual Serra também não deixou de pôr o dedo. Na Internet, verte um tsumani de denúncias, acusações, ofensas e calúnias. Como a tal rede mundial de computadores oferece essa facilidade, boa parte do que é vomitado não tem origem definida ou autor identificado. Com certeza – isso é claramente perceptível – parte de ambos os lados. Talvez alguns mais virulentos. Mas, nessa matéria ninguém é santo.

3 – Esses procedimentos dignos da idade da pedra é tão incorporado às campanhas eleitorais que os marqueteiros acabaram por descobrir que aí está um fator com tendência a favorecer seu candidato. É sabido que o sentimentalismo dos cidadãos pende quase sempre em favor do injustiçado, do ofendido, do que seria, portanto, teoricamente o mais fraco. Pois então por que não usar os episódios como se fossem maldades disparadas contra alguém indefeso? O que vi nestes primeiros dias das escaramuças do segundo turno me parecem demonstrar que a campanha de Dilma adotou a estratégia. Ou isso não ficou absolutamente transparente no confronto com seu opositor na noite de domingo?

4 – Para não deixar o assunto perdido, com cabeça mas sem pé, vou ao que considero as consequências da exploração do expediente. Este pode servir mesmo à candidata de Lula pela penetração espontânea de que ela desfruta junto ao eleitorado de condição sóciointelectual menos privilegiada. As pessoas simples são mais suscetíveis a emoções, pelo quanto de dificuldade curtem na própria vida. Em tese, pois, são levadas a se solidarizarem com quem consideram estar sendo injustiçado. No caso, injustiçada, tratando-se de Dilma. Sendo assim, colar em Dilma o rótulo da caluniada pode render adesões preciosas nessa faixa do eleitorado.

5 – A questão é saber a eficácia que esse expediente possui junto ao grupamento dos eleitores mais frios, mais racionais, aqueles que examinam os candidatos não por sensações emocionais, mas em face do conteúdo de cada um. Não se trata de dizer que estes não se emocionem ou sejam incapazes de chorar. Trata-se apenas de não ignorar a porção que estes possuem de carapaça capaz de evitar o arrepio dos pêlos e o amolecimento do coração. Na noite de 31 deste mês saberemos tudo isso, quando soubermos quem será o sucessor de Lula da Silva.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Divagações pós-eleitorais

Conhecido o resultado das urnas, construí a impressão de que as candidaturas genuinamente de Mogi Mirim foram conduzidas com certo grau de ingenuidade.

Faço a seguinte comparação: para se eleger vereador, não basta pintar muros e fazer barulho pelas ruas. É preciso ir aos fundões, conhecer lideranças, amarrar alianças e apoios, o que em geral não se consegue de graça. Porque eleição pressupõe custos.

As candidaturas a deputado obedecem – ao que entendo – exigência semelhante. Esparramar santinhos por outros municípios e sair em fotografias com prefeitos e outros personagens é muito pouco, senão nada mesmo, para arrancar votos em terra estranha.

Nesse sentido, se estou certo no que suponho que tenha acontecido, os cinco candidatos foram primários. Ou, ao contrário do que juraram durante a campanha, estavam mesmo é fazendo teste para a disputa municipal de 2012 – o que, sinceramente, considero o mais provável.

Para onde irá Marina

Supor que os quase 20 milhões de votos obtidos por Marina Silva são dela é laborar em erro. Ela é titular de parte. Da maior parte. Mas, parcela disso é voto migrado e de última hora, por desencanto com Dilma e Serra. Talvez mais com Dilma.

Esses votos migrados, portanto, teoricamente não têm destino certo para o segundo turno. E os votos dos quais Marina é titular podem ter uma tendência, mas com certeza não de forma homogênea. Se Marina Silva assumirá posição explícita ainda é uma incógnita.

Penso que, com a responsabilidade de uma liderança que emergiu do primeiro turno, Marina não poderá ficar em cima do muro. Precisará se expressar, ser o farol do seu eleitorado.

Mas, também será erro crasso antever que a palavra da candidata conduzirá seus liderados para o lado que pender. Como se sabe, o que vai pela cabeça do eleitor é insondável. Só o sabe ele mesmo. E nós, aqui, só ficaremos sabendo na noite de 31 de outubro.